quarta-feira, 24 de maio de 2017

Salve Santa Sara!




   No dia 24/25 de Maio é dedicado à Santa Sara Kali, conhecida também como a 'Princesa da Beleza Negra', e a Rainha e Protetora do povo Cigano.

Histórias/Lendas sobre Santa Sara.

   Conta-nos alguns historiadores, que por volta dos anos 50 d.c, uma embarcação teria cruzado os mares a partir de terras da Palestina; levando a bordo para fugir das perseguições de Roma aos primeiros cristãos... (sendo estes, um grupo de personagens bíblicos: Maria Jacobina ou Jacobé, irmã de Maria, mãe de Jesus, Maria Salomé, mãe dos apóstolos Tiago e João, Maria Madalena, Marta, Lázaro, Maximiliano e Sara, uma negra serva das mulheres santas). Milagrosamente, a barca que jazia sem rumo e à mercê de todas as intempéries, após as preces de seus integrantes, principalmente de Sara; atravessou o oceano e aportou com todos salvos em Petit-Rhône - uma pequena ilha situada em águas do Mediterrâneo, hoje conhecida como Saintes-Maries-de-La-Mer. Sara cumpriu a promessa até o final dos seus dias. Ela teria sido uma das primeiras convertidas ao cristianismo e morrido a serviço de suas companheiras de viagem.
 
   Outra versão é que Sara era uma escrava egípcia de uma das três Marias, Madalena, Jacobé ou Salomé; e junto com José de Arimatéia, Trófimo e Lázaro foi colocada, pelos judeus, em uma barca sem remos e alimentos. Desesperadas, as três Marias puseram-se a orar e a chorar. Aí então Sara retira o diklô (lenço) da cabeça, chama por Kristesko (= Jesus Cristo) e promete que se todos se salvassem ela seria escrava de Jesus, e jamais andaria com a cabeça descoberta em sinal de respeito (acredita-se que deste gesto de Sara Kali tenha nascido a tradição de toda mulher cigana casada usar um lenço que é a peça mais importante do seu vestuário. Prova disto, é que quando se quer oferecer o mais belo presente a uma cigana se diz: Dalto chucar diklô (= Te darei um bonito lenço)). Talvez por um milagre, ou por obra do destino, eles chegaram a salvo a uma praia próxima a Saintes Maries de La Mer. 

   Depois de muitos dias, o barco foi resgatado por moradores de uma vila próxima aos arredores da costa marítima. Todos, por serem brancos, foram acolhidos, exceto Sara, por ser escrava egípcia e negra. Um grupo de ciganos o fez, pois estavam nas proximidades e presenciaram o fato. Sendo assim, passaram a cuidar de Sara, que, com sua morte, posteriormente, os mesmos passaram a recorrer com pedidos a ela. Por ter sido uma pessoa querida em vida, os atendeu em espírito, realizando milagres. A partir disso, Sara se tornou Mãe e Rainha dos Ciganos, honrando-os e protegendo-os. 

  A capela em sua homenagem foi eregida após a sua morte, já que quando veio à falecer, os ciganos foram até a igreja da vila pedindo que seu funeral se realizasse lá, mas devido ao preconceito, os católicos da época recusaram. A partir de então, foi feito uma espécie de gruta/igreja para Sara, a qual é visitada até os dias atuais. 

   Em 1935 a Igreja tirou Sara de sua cripta, e muitos ciganos se aplicaram a 'prova do punhal'  que consistia em colocar um punhal avermelhado no fogo sobre a veia do pulso. Diz-se que o Sol queimou o olhar de Sara. Quando o número de ciganos aumentou, a cripta não deu para todos, e foi feito um acordo entre um gadjo chamado Marquês de Baroncelli, e um cigano chamado Cocou Baptista, um chefe cigano muito influente. Até um certo tempo o acordo foi cumprido, mas os seus sucessores não levaram o trato a diante. Este chefe cigano foi usado, simplesmente como um instrumento do gadjo, sendo mais tarde renegado e expulso pelo povo cigano. 

   Os ciganos de origem Calon, com o passar dos anos, alteraram algumas palavras da língua regional do povo cigano. Devido a estas alterações, houve algumas modificações idiomáticas no significado das palavras. Entre elas, podemos citar a palavra Kalin, que em Calon significa 'cigana'. Já para os ciganos que ainda preservam a língua regional, Kali significa negra. Há algum tempo, existe esta confusão idiomática, envolvendo a cor da pele da Santa. Para os Calons, seria Santa Sara Kalín , cigana, e não Santa Sara - a negra. Paralelamente a tal questão, a história de Sara chegou à Índia, onde os ciganos a associaram à deusa Kali (= negra, poderosa, transformadora).

  Já noutra versão conta-se que Sara era moradora de Camargue e teve piedade das Marias, resolvendo ajudá-las. Também dizem que ela era uma rainha das terras de Camargue ou uma sacerdotisa do antigo culto celta ao deus Mitra. Uma das explicações para estas histórias é que em Camargue existiram várias colônias de antigas civilizações, como a egípcia, a cretense, a fenícia e a grega. Por isso, muitos poetas e menestréis contaram a história de Sara, de acordo com o que ouviram de seu povo, e assim, o mito em torno dessa poderosa santa foi difundido pelo mundo; que continua, até hoje, a ser adorada entre as comunidades ciganas e mesmo fora destas. 

   Nos dias atuais, a Santa é comemorada com muitos rituais e tradições por mais de 15 milhões de ciganos espalhados em diferentes pontos da Europa, Ásia, África, Austrália e Nova Zelândia. E para preservar a história original de santa Sara Kali (como devota de Jesus), a igreja católica santificou-a, e é dessa forma que o povo cigano a cultua.

   Além de trazer saúde e prosperidade, santa Sara Kali também auxilia as ciganas, diante da dificuldade de engravidar. Na Tradição Cigana, o milagre mais importante da vida é o da fertilidade, assim quanto mais filhos a mulher cigana tiver, mais dotada de sorte ela é considerada pelo seu povo. Por outro lado, a pior praga para uma cigana é desejar que ela não tenha filhos e a maior ofensa é chamá-la de dy chucô (= ventre seco). Talvez, seja este o motivo das mulheres ciganas terem desenvolvido a arte de simpatias e garrafadas milagrosas para fertilidade. Muitas que não conseguiam ter filhos faziam promessas, no sentido de que, se concebessem; iriam à cripta da Santa, e fariam uma noite de vigília, depositando a seus pés como oferenda um diklô (= lenço), o mais bonito que encontrassem. ...E lá existem centenas de lenços, como prova que muitas ciganas receberam esta graça. Outro costume entre as mulheres ciganas é a confecção de saias, com as quais vestem a imagem da Santa.

   A proteção de santa Sara confere às pessoas emanações sempre benéficas que representam simbolicamente, o ventre da sua mãe, seu sorriso, a irmã e a rainha: a 'phuri dai' secreta dos Romis. Dizem que a pessoa de bom coração consegue ver o sorriso na estátua de santa Sara. Verá que tanto seu sorriso como o dela estarão diferentes. Para os ciganos a estátua de santa Sara está carregada, pois nela se condensam as energias sutis de muitas gerações de ciganos feiticeiros. assim, ela sempre atende a todos - principalmente, às pessoas que têm a intuição mais desenvolvida e usam os oráculos como forma de divinação.

   No Brasil, por parte do povo Cigano há também, uma enorme reverência à Nossa Senhora Aparecida talvez, por sua cor, equiparando-a à santa Sara Kali. Por isso em uma thiera (barraca) ou casa, haverá uma imagem de Nossa Senhora de Aparecida, haja vista a dificuldade  de encontrar imagens bem feitas de santa Sara, ou às vezes, encontrar-se-a das duas. Certo é que ela é a mais venerada Santa para os ciganos, e todo acampamento cigano conduz uma estátua da Virgem Negra depositada em um altar de uma das tendas; cercadas por velas, incenso, flores, frutas e alimentos.

   Assim também, como é de costume ao povo Cigano festejar as slavas (promessas ou comemorações em homenagem a algum santo), nos dias 24 e 25 de Maio é a slava de santa Sara Kali; e a slava de Nossa Senhora de Aparecida coincide com a comemoração dos gadjés, a 12 de Outubro. 

   Na Slava, é oferecido um banquete ao santo homenageado, onde é colocado o 'santo do dia' em local de destaque, como no centro da mesa, e junto d'ele, um manrô (pão) redondo, preparado com fermentação especial e asssado pela manhã quando o Sol está em plena atuação e brilho. Depois de pronto o pão é colocado em uma bandeja cheia de arroz cru, para trazer saúde e prosperidade.


    Durante a cerimônia é feito um corte específico pelo chefe ou homem mais velho da família (Purô Rom) neste manrô - que usará o punhal herdado de seu pai; sendo retirada de uma parte deste pão, e será derramado um bom vinho em pequena quantidade, porém antes da incisão, a matriarca (Phurí Dhieí) já terá salpicado o sal e colocado a vela (que ficará acesa durante toda a festa) proferindo palavras de benção. Depois da ritualização e do término do almoço, as mulheres mais jovens, muito enfeitadas e arrumadas - como homenagem aos convidados, se encarregam de distribuir pequenos pedaços deste pão ungido no vinho aos convidados e membros da família; desejando saúde, fartura e felicidade, pois onde há trigo há Prosperidade. Algumas famílias mais tradicionais fazem alguns procedimentos neste momento, com o simbolismo de moedas e preces específicas na representação da Prosperidade. 

   Normalmente junto aos votos de saúde e prosperidade são proferidas essas palavras de bençãos: 

THIE AVÊS THIAILÔ LOM, MANRÔ TAI SUNKAI 
(Que você seja abençoado com o sal, com o pão e com ouro).

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